Alguns dias atrás escrevi um post chamado Preâmbulo, o argumento
simplificado era que a internet ao permitir que qualquer um emitisse
opinião acabou formando um séquito de seguidores em torno de alguma
“celebridade”. Nada a ver com o seguidores de Restart, Luan
Santana e congêneres. O lance é mais sério, ou não.
Trata-se de
alguém de dentro de algum meio específico que com a internet
sente-se a vontade para desancar quem quer seja, inclusive seus
colegas, particularmente, seus desafetos. Mas não se trata apenas de
ressentimento, em alguns casos são ditas “verdades incômodas”.
O Luís Nassif fez isso com a Veja. O Diogo Mainardi fez isso muito
com seus supostos colegas jornalistas. O Reinaldo Azevedo vive de
fazer isso. A lista é grande e mistura gente honesta com canastrões.
Bem, mas voltando ao post, ele era ilustrado com uma troca de
mensagens pelo Twitter entre @GAYEGOS e um dos seus seguidores, havia
ali um deslumbramento do último pela editora de moda @ErikaPalomino
e uma crítica implícita a esse deslumbre por parte do estilista e
jornalista de moda.
Entendo nada de moda, mas sou leitor da chamada “grande imprensa”
desde adolescente, bem ou mal, quem começa a ler assim cedinho acaba
se tornando admirador daquelas pessoas que o faz abrir a cabeça para
coisas e pessoas que poderiam passar desapercebidas. Isso comigo foi
particularmente verdadeiro na minha relação com o Daniel Piza.
Alguns anos depois, essa admiração pode se perder no tempo, afinal
a gente evolui, alguns, pelo menos. Novas figuras aparecem
desbancando os “ídolos” do passado.
Mas estou desviando do assunto, como sempre. Eu quero falar da Erika Palomino. Sou um entre muitos dos seus entusiastas. Tornei-me
leitor da Erika ainda na Folha com sua Noite Ilustrada, arquivei
várias, achava incrível que alguém se propusesse a usar aquele
linguajar da noite, dos gays, da moda, pra mim aquilo era ousadia, os
personagens da noite ganhariam seu espaço ali; lembro dos cadernos
especiais quando a Erika ia assistir todos os desfiles da temporada
internacional, também guardei alguns; a revista de Moda da Folha,
enfim, acho que li muita coisa dessa temporada.
Mas Erika não era exclusivamente uma colunista de moda, tanto é que seu primeiro livro é muito mais uma síntese de comportamento do que um apanhado geral sobre a moda brasileira no período em que trabalhou na Folha. Mas como escreveria o Alcino Leite Neto, numa proporção mais ampla era a reprodução do estilo de sua coluna. Não à toa sua coluna acabou virando prêmio.
Erika parece ser uma pessoa que não gosta de oba oba, provavelmente
por ser workaholic.
Parece saber que, como eu, tem muitos outros que, de uma maneira de
outra, embarcam no seus projetos. Parece que ela não gosta da ideia
de ter fãs, deve preferir ter leitores. Parece ser exigente com seus
subordinados, ainda que, ao mesmo tempo, demonstre lhes oferecer
bastante liberdade. Parece que muitos dos jornalistas de moda, os pós
Erika Palomino, passaram por sua mão antes de alçarem novos voos.
Mas, sem dúvida, a Erika foi a última grande crítica de moda que
surgiu no últimos tempos, depois dela não teve mais ninguém que
tenha crescido tanto, que tenha tido a influência que ela teve. Do
ponto de vista da moda isso pretensamente seria bom porque supõem
que a existência de uma super editora tiraria o foco sobre a moda em
si ou, mais precisamente, das coleções. Ah, controvérsias ao
lembrarmos de nome como Décio de Almeida Prado ou Clement
Greenberg para ficar em dois exemplos. Sem forçar comparações,
tá?
Conforme escreveu Haley Phelan e algum estilista já tinha
dito o mesmo em algum lugar: os desfiles só podiam começar depois
que a Erika estivesse acomodada na fila A. Isso porque ela era,
naquele momento, a grande autoridade de moda no Brasil. Se a estrela
da jornalista apagou um pouco como diz a blogueira americana, isso
não quer dizer que Erika não tenha sido, mesmo nos seus tempos
áureos, chocada, inclusive na própria Folha.
Adriano Cintra, ex-CSS tinha um blog (A Diaba veste Fause) bem
amador mas divertido que chochava própria linguagem da Erika. Ah,
isso depois do sucesso né porque antes a “Erika foi foda”
ao impulsionar a carreira da banda.
Carlos Miele também mandou gongou a Erika e não apenas ela em
entrevista à revista VejaSP, entre outras coisas afirmaria: “O
problema são três jornalistas que costumam fazer críticas
descabidas ao meu trabalho: Erika Palomino, Lilian Pacce e Regina
Guerreiro. Elas lutam por uma reserva de mercado e qualquer um que
tente trazer novidades a um mundo colonizado como o da moda
paulistana fica malvisto...Elas
não têm capacidade de me entender. Meu trabalho é internacional
com raízes brasileiras, e o delas é nacional com raízes
internacionais. Para começar, elas não se vestem como brasileiras.
Erika Palomino era interessante enquanto foi clubber. Agora, quer
vestir-se como europeia, pintou o cabelo de loiro, deixou ele lisinho
e perdeu muito sua personalidade. Em pleno verão, Regina Guerreiro e
Lilian Pacce andam de gola alta, vestidas de preto, encapotadas,
sempre fazendo tipo de editora de moda europeia...Picasso levou
trinta anos para pintar como uma criança. Elas me criticam, na
verdade, porque eu vou buscar referências em minhas raízes, no
candomblé, nos índios, enfim, nos excluídos...elas são sempre
convidadas para se sentar nos melhores lugares em meus desfiles. Só
que elas não têm olhar para o novo. Regina Guerreiro disse que eu
era uma piada fashion, criticou-me por fazer muitos brilhos e plumas,
que depois subiram nas passarelas do mundo inteiro. Críticos mais
inteligentes que ela falaram que Duchamp não fazia arte, que Jorge
Amado era medíocre. Não é ela quem vai me dizer o que fazer.
Lilian Pacce escreveu que eu deveria vender só camiseta e jeans,
porque não faço moda. Agora, meus vestidos estão nas melhores
lojas do mundo"
O Álvaro Pereira Júnior, que também era um grande interlocutor meu
com sua coluna no FolhaTeen escreveria sobre o livro que aborda os 50
anos da Ilustrada que "Por
fim, o livro aborda como processo contínuo algo que, a meu ver,
representou na verdade uma forte ruptura. O relaxamento da atitude
essencialmente crítica, representada por gente como Pepe e
Forastieri, para, a partir dos anos 1990 de Érika Palomino, abraçar
também um tipo de jornalismo amigo e "construtivo",
participante de cena que cobre, ao menos na área pop”.
Parece que essa opinião era compartilhada pela própria direção do jornal pois em entrevista para o site da MTV, Alcino Leite Neto, que foi convidado para ocupar a vaga de editor de moda após a saída de Erika, afirma que uma das coisas que pesou para aceitar o convite foi o fato de que “a "Folha" queria mudar o rumo da cobertura de moda, tornando-a mais jornalística”
Mas o próprio Álvaro Pereira Jr. chamaria atenção para
importância da Erika na cena em uma de suas colunas: “Leio
uma entrevista com a colunista da Folha
Erika
Palomino. Indagada sobre o que acha da explosão da moda brasileira,
ela responde, com sobriedade, que a moda do Brasil passou por um
desenvolvimento sem precedentes nos últimos anos, mas que ainda
falta muito para que tenha projeção internacional. Conclusão.
Seria fácil para a Erika dizer que a moda brasileira é o máximo,
que mais uma vez o mundo se curva diante do Brasil etc. etc. etc.
Afinal, foi ela a primeira jornalista do país a lançar jovens
estilistas e a perceber que havia interconexões importantes entre a
moda que nascia e toda uma cena musical, a eletrônica. Mas, na tal
entrevista, Erika preferiu o caminho da lucidez: reconheceu o talento
local, ressalvando que ainda faltam anos-luz para que São Paulo
possa ser comparada a Paris, Nova York ou Milão”.
Por que escreve tudo isso? Porque essa semana terminou a SPFW e a Erika Palomino estava lá cobrindo o evento, oficialmente na cobertura do portal FFW e para sua revista L'Officiel. E porque seria forçar a barra negar a participação da Erika Palomino na consolidação do atual calendário de moda brasileiro.